domingo, 13 de outubro de 2013

Gravidade

(Gravity, USA, UK, 2013) Direção: Alfonso Cuarón. Com Sandra Bullock, George Clooney.



Por João Paulo Barreto

Alfonso Cuarón consegue uma proeza: em um filme enxuto (apenas 90 minutos), apenas uma personagem sozinha durante quase toda a projeção e ainda assim o co-roteirista e diretor consegue criá-la com uma profundidade dramática cuja dor de um passado trágico surge de modo natural e dolorosamente cativante.
    
Exato, não somente pelos efeitos visuais fantásticos, pelos planos sequenciais hipnóticos e pela trilha sonora sufocante de Steven Price; Gravidade cativa o espectador pela dor na história de vida da médica e astronauta de primeira viagem Ryan Stone (Bullock) e pelo modo como esses detalhes particulares da personagem são sutilmente inseridos em uma trama aparentemente simples, cujos contornos psicológicos, porém, fazem toda a diferença.

Solta à deriva no espaço após sua estação ser atingida por destroços de satélites na órbita terrestre, Stone precisa chegar a outra estação espacial sendo essa sua única forma de voltar a terra. Com apenas esse fiapo de história, um diretor qualquer faria um filme qualquer. Porém, Curón já havia dirigido Filhos da Esperança. Ou seja, havia algo ali que poderíamos confiar que geraria um resultado no mínimo curioso. O que veio, no entanto, foi algo espetacular.

Clooney e todo o seu modo cool Clooney de ser 
Sim, Gravidade é um espetáculo visual. Porém, não é um filme que se suporta somente nisso. Quando vemos, do alto do espaço sideral, a bota que forma a Itália em toda sua grandiosidade e reconhecimento, aquilo não é apenas uma forma do filme exibir sua competência plástica, mas, sim, uma moldura para uma história cuja profundidade vai muito além disso.

Nessa história, George Clooney interpreta, claro, George Clooney. No entanto, na pele do experiente astronauta Matt Kowalski, o ator traz uma confiança que o papel exige. Com sua presença cool e sorrisinho de canto de boca, traz um autoridade que se equilibra entre a necessidade de ter pulso firme quando necessário e a doçura e camaradagem de um profissional que sabe como utilizar suas dezenas de horas no espaço como algo a trazer conforto e segurança para seus colegas inexperientes nesse campo.

Uma das cenas chave do filme nesse sentido é a conversa confessional entre Stone e Kowalski. Visivelmente buscando acalmar a doutora no sentido de fazê-la respirar devagar e não esgotar seu oxigênio (“vinho, doc, não cerveja”), Matt pergunta, enquanto um country music toca na saída de som de seu traje, sobre o que ela estaria fazendo se estivesse em casa agora. Se há algum Sr. Stone lá embaixo olhando pra cima e sonhando com ela. Na crueza da resposta (“Eu tinha uma filha. Ela bateu a cabeça e morreu”) e no silêncio posterior, sem música e sem palavras, nota-se que o astronauta percebeu ter adentrado em um terreno um tanto áspero para se movimentar. Seu silêncio soa melhor que qualquer tentativa de conforto.

Bullock no momento mais marcante e dramático de sua atuação
E o roteiro de Cuarón (escrito em parceria com seu filho, Jonás) nos traz esse passado trágico como uma pista cuja belíssima e tocante recompensa aparecerá em uma das cenas chave do filme. Nessa cena, toda a esperança de Ryan parece se desvanecer, mas a lembrança de uma garotinha “com cabelos cheio de nós e que não gosta de escová-los” lhe traz força para não desistir. Mais do que um filme de plasticidade e efeitos perfeitos, Cuarón construiu um drama que se sustenta.

E, além do espetáculo visual que nos remete, obviamente, a Kubrick e Tarkovsky, o que mais chama atenção em gravidade é a atuação de Bullock, uma atriz que, conhecida por sua inegável limitação de talento, entrega uma atuação que merece aplausos por dramaticidade e competência. Talvez dessa vez o Oscar lhe seja realmente merecido.

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