terça-feira, 12 de março de 2013

Django Livre


(Django Unchained, EUA, 2012) Direção Quentin Tarantino. Com Jamie Foxx, Christoph Waltz, Leonardo DiCaprio, Samuel L. Jackson.


Por João Paulo Barreto

O modo como a relação entre o negro e o branco fora retratada pelo cinema antes de Quentin Tarantino se aventurar em abordar um tema tão delicado sempre foi a de protecionismo e de exclusiva dependência do primeiro em relação ao segundo na resolução de seus problemas. Filmes como Amistad, Lincoln ou o sofrível The Help, para citar apenas três, são exemplos claros de como Hollywood prefere visitar fatos nos quais os brancos são vistos como, ao mesmo tempo, vilões e salvadores. Observar o primeiro herói negro do período da escravatura emergir em uma vendeta banhada de sangue era o mínimo que podíamos esperar de Tarantino após a sua versão para a morte de Adolf Hitler em Bastardos Inglórios.

Diferente do longa anterior, no entanto, dessa vez não houve uma recriação histórica em 100% dos fatos, mas uma apropriação de um contexto real e a inserção de novos elementos. O Django de Jamie Foxx, a despeito de levar o nome do personagem imortalizado por Franco Nero na produção da década de 1960, não possui relação direta com este (apesar da música e dos créditos iniciais o referenciarem). Nada de caixões repletos de armas sendo arrastados, mas puramente uma história de vingança na qual corpos são explodidos com chumbo e o sangue exibido pelos efeitos visuais do mestre John Dykstra não cria asco no espectador, mas, sim, regozijo.

Stephen e sua posição social de destaque
Sem maniqueísmo, no entanto, Tarantino não pinta os negros apenas como as vítimas do processo de escravidão americano. O personagem de Samuel L. Jackson, Stephen, demonstra de forma perfeita o interesse econômico e a conveniência de alguns (negros e brancos) por trás desse processo. A relação estreita entre Stephen  e o Calvin de Leonardo DiCaprio, denota o fato de que não há orgulho ou revolta para alguns dos oprimidos quando o que está em jogo é o interesse pessoal. Sobrevivência supera qualquer ativismo. E qual a diferença entre Stephen e Calvin senão apenas a cor da pele? Quando se trata de dinheiro, até isso se torna irrelevante. Se for preciso abrir mão da vingança pela morte de um ente querido por grana, Stephen o fará. Mesmo que isso signifique seu maior erro.

Do mesmo modo que em Kill Bill, em Django, Tarantino criou um diálogo símbolo do filme. Lá, tal passagem era acerca do Superman e sua relação com a raça humana; aqui cabe a Leonardo DiCaprio o mais impactante monologo do longa, quando este apresenta “razões científicas” para o que o roteiro chama de natureza submissa dos escravos. Tal diálogo chega a chocar em determinado momento, porém, ao percebermos que o mesmo é proferido por um sociopata que se diverte vendo homens matando uns aos outros em lutas sanguinárias (UFC? Alguém?), acaba-se por entender a origem de tal hedionda constatação.

Dr. King: nobre assassino em um mundo de valores corrompidos
No meio de tudo isso, uma gênese cômica e imbecil para a Ku Klux Klan (tão imbecil quanto seus preceitos) e um personagem coadjuvante branco e alemão que representa ao menos um pouco de esperança para o conceito de humanidade do filme. O Dr. King de Christoph Waltz, apesar de um assassino e caçador de recompensas, acaba por representar o que há de mais justo e nobre nos homens daquele universo tarantiniano. Sobrevivente, o homem é fruto de um contexto histórico. Em um mundo tão corrompido de valores morais onde a vida de seres humanos é tratada como mercadoria e/ou lixo a ser descartado, um assassino com aquela natureza benéfica acaba por ser o supra sumo da bondade e da esperança em dias melhores.

Isso vindo de Quentin Tarantino é o máximo que podemos esperar de alguém com bom caráter. Mais do que suficiente, friso.  

Um comentário:

  1. Olá, João!
    Passei para lhe convidar à participar do sorteio de aniversário do Lumaniacs! Não sei se vai lembrar ... vc contribui para minha postagem à respeito do filme 31 Minutos! ;)

    http://lumaniacs.blogspot.com.br/2013/03/sorteio-de-aniversario_11.html

    Bjs Obrigada!

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